O Pedalar Sem Idade Lisboa é um projeto simples (basta a boa vontade de voluntários e umas bicicletas – trishaws) para um problema complicado: “a solidão e o isolamento não-desejados junto dos mais de 100 mil idosos que estão sozinhos em casa e nos lares, por Lisboa fora”.
Por isso, não nos deixemos enganar pelo nome do projeto. Pedalar sem Idade não é uma iniciativa sobre bicicletas nem mobilidade. É “uma forma de estar na vida”. É sobre relações humanas como a que retrata esta foto (em destaque) com Maria do Carmo e Carla Palmeiro (Vice-Presidente da Pedalar sem Idade Lisboa).
Esta é uma das muitas histórias proporcionadas pela iniciativa que, pela mão e persistência de Rui Guedes de Quinhones, Presidente da Pedalar Sem Idade Portugal, procura “uma solução para ajudar os mais idosos a sentirem-se menos sós, menos isolados e mais apoiados nas suas casas, Lares e Centros de Dia”, explica Carla.
Um passeio aos 92 anos
Carla foi “convocada” um destes sábados soalheiros, pelas voluntárias da Serve The City de Lisboa, para surpreender, com um passeio, uma senhora de 92 anos. Um luxo nos tempos que correm para quem é nonagenário e vive num 4º andar. “Vamos lá ver que surpresa é esta!”, disse Maria do Carmo a Carla, enquanto terminava de retocar a maquilhagem. “A sua mobilidade já é reduzida, o que a impede de sair e ir muito mais além do Café no rés-do-chão do prédio ou o Jardim da Parada, a 10 metros da sua porta. Decidi levar a D. Maria e a voluntária Catarina ao Jardim da Estrela, para tomar um café, um lugar que nos confessou já não ir há mais de 10 anos. A alegria e boa disposição eram notórias. Ri e sorri muito durante o nosso passeio com a história de vida que a D. Maria tinha para partilhar comigo. Na sua juventude, trabalhou muitos anos como representante de uma marca de cosméticos e foi considerada uma das melhores vendedoras da marca a nível mundial. Viajou por muitos países e recordou comigo, a bordo do trishaw, pedaços da sua vida pessoal. Senti que aprendi e absorvi mais do que dei. Fiquei de coração cheio”, conta-nos Carla.
É o sr. José, invisual, que nos indica o caminho
Em tempos de pandemia, estes pequenos momentos são ainda mais desejados. Que o diga o senhor José, invisual e “cliente” habitual dos passeios conduzidos por Carla. “O que mais me fascina é que o Sr. José é que nos indica o caminho, desde que saímos da sua casa, perto da Avenida dos Estados Unidos da América, até ao Jardim do Campo Grande. As suas semanas, desde o início da pandemia, têm sido solitárias e isoladas, em casa. Com a ajuda dos nossos voluntários, da animadora do Centro Social e Paroquial do Campo Grande, a Daniela, temos tornado os dias do Sr. José mais felizes e bem dispostos, promovendo uma redução nos seus níveis de depressão e mau-estar causados pelo confinamento obrigatório ligado à Covid-19”,
Carla sente “que mudamos o mundo, ao volante de uma bicicleta, um bocadinho, todos os dias”. Com
uma conversa, uma história ou um novo amigo a bordo de um passeio de trishaw pela cidade.
E assim se muda o mundo, para melhor, todos os dias, um bocadinho. Boa iniciativa!
Mais de 800 passeios gratuitos
O projeto conta com cerca de 25 voluntários formados e já proporcionou mais de 800 passeios gratuitos a idosos e a pessoas com mobilidade reduzida, desde Setembro de 2019, por locais como o Campo Grande, Alvalade, Campo de Ourique, Rato, Parque das Nações e Carcavelos, entre outros.
Qualquer cidadão pode inscrever-se gratuitamente para tornar-se voluntário, através do site www.pedalarsemidadelisboa.pt. “Não há idade limite para voluntários, visto que o nosso voluntário mais idoso tem 90 anos e reside em Singapura”, refere Carla Palmeiro. Por enquanto os trajetos são em Lisboa, mas ainda este ano, preveem chegar a Cascais, através de uma parceria com a Câmara Municipal de Cascais.
A Pedalar Sem Idade Lisboa foi fundada em Novembro de 2018 em Portugal, e é inspirada na Cycling Without Age, de Copenhaga, cujo fundador e impulsionador é Ole Kassow e “já levou felicidade, vontade de viver e muito vento nos cabelos a mais de 1 milhão e meio de pessoas em todo o mundo, em 50 países, através de 33 mil voluntários”.