Fátima Daniel, Instituto de Saúde do Cabelo, dedicado à produção de próteses para pessoas oncológicas.

“Antes da pandemia, fazia duas próteses por mês. Agora chegam-me quatro pedidos por semana. É assustador”, Fáti, cabeleireira

Hoje, 4 de fevereiro, Dia Mundial do Cancro, contamos a história de Fáti. Uma mulher que mudou vidas após o diagnóstico de cancro.

51 anos. E um otimismo teimoso. Fátima Daniel, conhecida por Fáti, nasceu em França, onde estudou e trabalhou com a elite dos salões de cabeleireiro. Tinha 24 anos quando decidiu explorar fronteiras e voltar à casa natal dos pais: Campo Maior, em Portugal. Os pais, emigrantes, ficaram. Fáti veio sozinha, à frente. E abriu o seu primeiro salão na vila raiana. Apaixonou-se por um jogador de futebol, foi mãe. E entendeu rumar à capital, em busca de novas experiências no setor. “Sempre que cortava cabelos longos, que depois iam para o lixo, sentia um enorme desconforto. Comecei a agarrar nos cabelos e, com o consentimento dos clientes, enviava-os para o Reino Unido, para associações que produziam próteses capilares para mulheres submetidas a quimioterapia”, conta Fáti.
Há 10 anos, quando recebeu o diagnóstico de cancro da tiroide, a sensibilidade para esta questão aumentou.  (O cancro da tiroide é geralmente silencioso, mais frequente nas mulheres. Em Portugal surgem por ano mais de 500 novos casos de cancro da tiroide.)

“Eu sei o que é receber um diagnóstico de cancro”, refere. Fáti fez então a pergunta: “e se fizer eu as próteses capilares, apoiando assim outras mulheres como eu?”. Os casos começaram a aparecer lentamente. E Fáti juntou a vontade de ajudar à sua arte de cabeleireira. “As mulheres que começam a fazer determinado tipo de quimioterapia que provoca queda de cabelo vêm, geralmente após o primeiro tratamento, cortar o cabelo. Eu faço um corte elegante, à garçonne, não rapo de imediato. Porque é doloroso. E com o próprio cabelo, faço a peruca. Mantenho o corte, a cor”. Procura manter o sorriso. Há dias, uma mulher com cancro da mama procurou Fáti. A decisão estava tomada: não iria partilhar a situação com os filhos, menores, o que implicaria fazer este trajeto em círculo fechado.  Mas o primeiro tratamento de quimioterapia já tinha produzido efeitos visíveis. Fáti cortou-lhe o cabelo e, de um dia para o outro, cozeu durante largas horas aquela que será a sua imagem nos próximos tempos. Uma prótese muito semelhante ao corte de cabelo que tinha. “E o meu cabelo? É a pergunta que colocam muitas mulheres com cancro da mama, quando lhes é prescrita a quimioterapia”, conta Fáti.
Nem sempre é possível usar apenas o próprio cabelo e Fáti recorre a doações. O resultado é uma “prótese abaixo do valor de mercado, graças às doações. Há seguros que comparticipam. Mas o ideal seria a Segurança Social comparticipar na totalidade. O cabelo é uma parte delicada da doença”, conta.
Assim nasceu o Instituto de Saúde Capilar, atualmente quase dedicado à produção de próteses capilares e “bem estar/cuidados capilares para doentes oncológicos. Os tratamentos de quimioterapia queimam o bulbo piloso. É necessário ‘limpar’ para que o cabelo volte a crescer com vitalidade. Existem tratamentos que podem ajudar”, refere.
Nos últimos tempos, Fáti tem investido em adquirir mais conhecimento nesta área. Porque os casos multiplicam-se: “antes da pandemia, fazia duas próteses por mês. Agora chegam-me quatro pedidos por semana”. E Fáti não larga as suas clientes: “envio dicas de saúde, vídeos, conselhos por whatsaap. É preciso manter a esperança”.
Fáti dá o exemplo: “acordo todos os dias às sete da manhã e não dispenso uma caminhada diária com a minha filha. Não há bolachas cá em casa. Não há excessos desnecessários. Transmito estes princípios de estilo de vida saudável aos meus filhos. E contagio as minhas mulheres, com força e esperança”.

*Segundo a Liga Portuguesa Contra o Cancro, há mais de 6000 novos casos de cancro da mama em Portugal por ano — e estudos recentes mostram que afeta cada vez mais mulheres jovens.

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Fáti, Cabeleireira, especializada em próteses capilares com o próprio cabelo das mulheres. Conta com doações para baixar o valor final das perucas.

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