Garrett McNamara

Lobo do mar

Quando descobri que Garrett McNamara estava prestes a bater mais um recorde pessoal, desta vez em Lisboa, não tive dúvidas: o surfista americano era o segredo da capa desta edição. Porque, além do surf, a sua vocação é Portugal.

Chegou ao estúdio bem acompanhado. Além da mulher, Nicole, e do adorável Barrel, o filho de três anos, fomos ainda agradavelmente surpreendidos por uma equipa de televisão norte-americana que, de câmara em punho, registava, para o documentário que estão a fazer sobre o ‘Lobo do Mar’, todos os momentos da nossa produção fotográfica. Garrett McNamara está de volta a Portugal, depois de em março deste ano ter aqui lançado a sua biografia, Lobo do Mar (pela Marcador). Todos os anos passa uma temporada no nosso país, mas 2017 é especial.

50 anos!

No dia 10 de agosto, fez 50 anos e, para assinalar meio século e agradecer a hospitalidade dos portugueses, propôs-se a cumprir mais um recorde pessoal no Tejo e a percorrer a costa com aulas gratuitas de surf. “Na mais bela cidade da Europa! Vamos ver se consigo surfar esta onda durante dez minutos!”, escreveu o surfista norte-americano no Facebook. No dia 17 de agosto, e numa iniciativa patrocinada pela Mercedes-Benz, McNamara surfou, assim, a onda mais longa da sua vida, com 4 km de comprimento. Entre a partida, na Doca de Santo Amaro, e a chegada à Torre de Belém, um barco provocou a ondulação de que McNamara precisou para surfar no rio Tejo e bater o seu recorde pessoal.

Garrett McNamara falou-nos ainda da terceira edição das Buondi Surf Sessions: aulas gratuitas nas praias nacionais dadas pelo próprio McNamara (com um limite de 30 vagas por aula) e que incluem ainda aulas de surf adaptado e de stand-up paddle (SUP) para maiores de 50 anos.

Estou sempre a surfar. E quando não estou a surfar estou a trabalhar para conseguir surfar”, conta aquele que se tornou num embaixador das grandes ondas portuguesas.

“A Nazaré o sítio mais especial do mundo. Assistir às ondas a explodirem na Nazaré é uma experiência que todos deveriam conhecer. Estou muito grato à Nazaré e a Portugal por me convidarem para vir até cá”, diz-me.

Assistir às ondas a explodirem na Nazaré é uma experiência que todos deveriam conhecer. Estou muito grato à Nazaré e a Portugal por me convidarem para vir até cá”, diz-me.

E, com a ajuda do ‘Lobo do Mar’, recuamos ao tempo em que McNamara era “o miúdo descalço com os calções de surf esfarrapados, o ladrão de bicicletas que se baldava às aulas, o pedrado que não se empenhava em nada”.

Aos 11 anos, a mãe, solteira, decidiu ir viver com os seus dois filhos para ir o Havai: “A nossa mãe não sabia que estava a selar o nosso destino quando nos largou no centro escaldante do surf mundial.” O mar não o convenceu de imediato, mas “a nossa mãe sabia que dois rapazes não podiam ter a esperança de viver no Havai sem surfar. Conseguiu encontrar uma maneira de nos dar uma prancha. Talvez tivesse pago 10 dólares por ela numa venda de garagem…” Era a sua primeira prancha, pesava 25 quilos, e os irmãos McNamara tiveram de carregá-la os dois para a praia. Garrett apaixonar-se-ia depressa pelas ondas − e sobretudo pela sensação única de desfrutar delas. Durante muitos anos, participou com o irmão em competições ocasionais, nas quais era conhecido pelo irmão de Liam, que na altura exibia mais aptidões para a modalidade. Até um dia participar numa prova e acabar “entre os que tinham direito a prémios monetários. Ganhei 250 dólares! A minha carreira encontrara-me. Eu ia ser surfista profissional. Comecei a ir às aulas, subi as minhas notas para C e V, e acabei o liceu em junho de 1985.”

Com as vitórias, chegaram os patrocínios. Apesar da importância da expressão work to surf, o dinheiro não era todo igual… “Recebi um telefonema da Red Bull, com a qual assinei um contrato (que rescindi anos depois, quando se soube que as bebidas energéticas faziam mal ao coração e à saúde em geral)”, conta no livro Lobo do Mar.

Um dos últimos capítulos do livro chama-se Nazaré, meu coração. É aqui que Garrett recorda o dia em que Nicole, a sua mulher, “encontrou uma troca de mensagens, cinco anos antes, entre mim e um bodysurfer português chamado Dino Casimiro, a respeito de uma onda grande que quebra na praia de uma antiga vila de pescadores chamada Nazaré”. O que é que tu achas deste sítio, a Nazaré?, perguntou-lhe ela, professora de ciências e também surfista.

“Todo o surfista sonha em descobrir uma onda, ser o primeiro a pô-la no mapa”, conta Garrett no livro. E assim foi. Garrett e Nicole passaram o inverno de 2011 em Portugal, na Nazaré, “a documentar a nossa demanda da maior onda do mundo”.

‘A onda’

A fotografia de Garrett naquela que haveria de ficar conhecida como ‘A onda’ deu a volta ao mundo. Até Kelly Slater escreveu no Twitter: “Acabei de ver uma imagem do Garrett McNamara, de Portugal, numa onda estupidamente grande. Ele devia postar aquilo o mais depressa possível.”

A Nazaré deu-lhe ‘A onda’. E Garrett McNamara, o detentor do recorde do Guinness por surfar a maior onda de sempre e o primeiro estrangeiro a receber a condecoração Medalha Naval Vasco da Gama, atribuída pelo Estado português, colocou aquela vila pesqueira no circuito mundial dos melhores spots para fazer surf. “Obrigada.”

 

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