“Não aguentei e disse-lhe: ‘Sr. Woody Allen, sou uma grande admiradora, mas pensava que esta entrevista iria ser mais divertida…”

No mês em que falo de silêncio, pedi à atriz e apresentadora Catarina Furtado que partilhasse alguns dos momentos da sua vida em que optou por falar e por ficar calada. Boas histórias, conta-nos! 

Por Catarina Furtado
Silêncio…

Numa das minhas recorrentes viagens à Guiné-Bissau em trabalho, enquanto Embaixadora de Boa Vontade do Fundo das Nações Unidas para a População (UNFPA) e documentarista do programa Príncipes do Nada (RTP), ao acompanhar projetos na área da saúde materna e neonatal, assisti (mais do que uma vez!) a mortes evitáveis de mães, saudáveis, a dar à luz. E assisti também ao nascimento de bebés que morreram segundos depois de terem nascido, com as suas mães a despedirem-se deles num encolher de ombros que cala qualquer pessoa.

Nessas circunstâncias, que jamais esquecerei na vida, as palavras não fazem parte da comunicação. Não só não saem, como não existe nenhuma que seja verdadeiramente reconfortante.

A aceitação de um destino que poderia não ser aquele, se tantos compromissos assinados fossem respeitados em prol da igualdade de direitos, é revoltante, mas não permite, naquela hora, que se solte alguma palavra de luta. Nessas alturas, o silêncio, acompanhado por um abraço solidário, demorado e apertado, é a melhor opção.

 

Não me calo quando…

a injustiça é de tal ordem ofensiva. Acho que não fará sentido calarmo-nos porque a nossa consciência cívica deverá estar sempre ativa até partirmos. Já me aconteceu muitas vezes, através do exercício da diplomacia, dizer o que penso por muito que possa estar a ferir o protocolo ou o politicamente correto. Em países com culturas diferentes, desde que exista violação dos direitos humanos, tenho sempre tentado deixar a minha opinião fundamentada. O medo come a alma.

“Não aguentei e disse-lhe: ‘Sr. Woody Allen, sou uma grande admiradora, mas pensava que esta entrevista iria ser mais divertida...” 2016-03-29-GettyImages-480838842

Uma boa história…
Lembro-me de quando ainda estava a trabalhar na SIC e fui entrevistar um ídolo, o realizador Woody Allen. Os meus nervos eram imensos e a preparação para a entrevista foi exaustiva. Quando lá cheguei, Woody Allen tinha os olhos colados ao chão e cada resposta era dada assim mesmo, sem olhar para mim. A desilusão foi grande e, no final da entrevista (já nada poderia acontecer porque, pelo menos, tinha as perguntas e as respostas todas na minha posse), em jeito de despedida, não aguentei e tive de lhe dizer: “Sr. Woody Allen, sou uma grande admiradora, mas pensava que esta entrevista iria ser mais divertida…” Ao que ele me respondeu de imediato e a olhar-me pela primeira vez de frente: “Pois, mas eu só digo piadas quando me pagam.” Acredito que este tenha sido um dia não na vida de Woody.

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