“O que mais gostei de viver: o amor”, Avó Aldina, 103 anos

“Gosto de ver o programa da Júlia”, Aldina, 103 anos.

A Avó Aldina, como lhe chamam, completou 103 anos há dias. É uma exceção à regra dos 84 (anos), estabelecidos como a esperança média de vida para as mulheres em Portugal. Mas sobretudo é uma espécie de força da natureza que, de sorriso generoso no rosto, agradece a Deus por concretizar o seu pedido – “chegar a esta idade e estar bem de tino”.

 

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Não gosta de estar sozinha, confessa. E também por isso terá aceitado receber-nos em sua casa, não sem antes certificar-se de que estava bem maquilhada e vestida para acolher visitas. Os bons hábitos ao espelho permanecem inabaláveis.

“Sempre fui muito vaidosa. O corpo é o templo da alma…” O tempo não lhe levou a vontade de conversar, nem a destreza com que aplica o batom cereja, outrora vermelho, a cor que contrasta e marca uma singular beleza nas fotos a preto e branco do seu álbum da juventude.

Com as fotos entre mãos, recuperamos  a Aldina jovem que casou aos 24 anos, com o homem que o seu pai escolheu para a levar ao altar e com quem viveu durante mais de 80 anos. Aldina, a avó Aldina como lhe chamam na família, não se importa de remexer o baú das memórias . “Recordar é viver”, explica. E, agarrando com afinco o tempo verbal presente, diz-nos com toda a firmeza: “Gosto muito de viver”.

O que mais gostou de viver Avó Aldina? “O amor”, responde sem hesitar. O amor nas suas mais variadas vertentes. Aldina tem uma família grande e aos 103 anos seria natural que tivesse perdido a conta e a lembrança da linhagem. Mas, com a ajuda dos dedos, não há um nome de um neto que lhe escape: Dos filhos Fátima e Manuel, resultam os netos Inês, Sofia, Ana Rita, Catarina e Franky, Cláudia, Jawa e o Ivan.

Queremos saber o Santo Graal da juventude, o creme que garante uma pele seda aos 100 anos. E a avó Aldina satisfaz a nossa curiosidade: “A vida é um sonho. Temos que a aproveitar muito bem”. Como assim, avó Aldina. Durante toda a sua vida, conta-nos como se preocupou com os outros, sem nunca prejudicar ninguém. Fala-nos do seu instinto natural para detetar más energias, e da forma como se afasta da falta de integridade. Esteve ligada a causas humanitárias, fundou a Casa Menino de Deus, recorda como correu risco no Casal Ventoso de antigamente, onde era realmente perigoso entrar, ainda que fosse em missão de paz. “A senhora dá tanto e depois quando quiser, não tem”, diz-lhe a empregada, uma amiga e jovem que a avó Aldina acolheu em tempos e que até hoje lhe permanece fiel nos cuidados. Dar não é defeito, é feitio.

“Cheguei a esta idade e quando olho para trás, tenho a sensação de que nasci ontem”, partilha.

Viajou, tocou piano, escrevia poesia e pintou. As histórias continuam nos quadros da sua sala de estar: um deles, retrata o pastor engenheiro, um homem real que se formou na universidade à custa de muita apanha de erva e de muitas noites no palheiro. Um outro quadro foi-lhe oferecido por uma amiga, cujos problemas de saúde lhe afetavam a visão: “ela ficava sem ver, por períodos de tempo, por isso pintava muito depressa para aproveitar enquanto tinha visão”.

A avó Aldina recorda como, além da família, as amigas foram importantes na sua vida.” Tenho muitas amigas”, conta. A neta Inês aproxima-se e corrige: “As suas amigas já morreram. Na sua festa dos 103 anos só cá estava uma amiga e tem menos 20 anos”. Correto, consente. A avó Aldina, a filha mais velha de cinco irmãs é a única que está viva. “Mas eu ainda gosto muito de conviver.”

Ainda faz palavras cruzadas e sudoku ao deitar. Ainda gosta de ver a Júlia na televisão. Ainda dá os mesmos conselhos ao jovens: “vivam bem a vida, amem-se uns aos outros, ajudem-se e trabalhem. A vida passa a correr”.

Ainda faz festas de aniversário. E ainda faz pedidos a Deus: “Deixa-me viver mais dois anos para eu ver o meu Tiago a crescer…”.  “Agora penso em viver para os outros, viver para o teu filho”, diz para a neta Inês.

É a nossa deixa. A avó Aldina tinha centenas de mais histórias para contar. Mas a neta Inês dita a hora de descanso: há que preservar o maior e mais antigo património humano da família: A avó Aldina.

 

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