Marcelo Rebelo de Sousa

“Assim fez. O Presidente estava na fila para comprar o seu bilhete”, Guilherme Trajano, ator brasileiro

“Nunca tive um Presidente na plateia. As prioridades no Brasil são outras”, Guilherme Trajano

 

No final da peça Dama das Camélias, o ator brasileiro Guilherme Trajano estava a tirar umas fotografias com o público, quando foi surpreendido por um “senhor muito bem vestido” a entrar no salão do teatro Gil Vicente, em Cascais. O senhor em questão procurava mais informações sobre o horário do espetáculo. “Olhei e pensei: É o Presidente! Ainda olhei para algumas pessoas conhecidas que estavam ao meu lado, para confirmar, pois estava incrédulo com aquela presença”, conta-nos o ator.

Marcelo Rebelo de Sousa explicou que não queria perder o último dia da peça, já que não tinha conseguido chegar a tempo no passado sábado. “Disse-me que tinha ouvido falar muito bem do espetáculo e que, no dia seguinte, lá estaria, assim que as portas do teatro abrissem. E assim fez. No domingo, última apresentação, o Presidente da República estava na fila para comprar o seu bilhete”.

"Assim fez. O Presidente estava na fila para comprar o seu bilhete", Guilherme Trajano, ator brasileiro Marcelo-Rebelo-Sousa-Teatro-Dama-das-Camélias

Marcelo Rebelo de Sousa assistiu à estreia do ator em Portugal, na peça Dama das Camélias

Primeira pergunta: o que sentiu ao pisar o palco no último dia da peça Dama das Camélias, sabendo que tinha o Presidente da República de Portugal na plateia?

Faço sempre o meu melhor para qualquer pessoa que esteja na plateia. Seja uma, seja mil pessoas. Seja um cidadão comum ou o Presidente. Quero que todos se divirtam e saiam felizes do teatro.

Mas é normal que, ao saber que o Presidente da República está na plateia, o frio na barriga aumente. Soube apenas minutos antes da peça começar que o Presidente estava ali. E disse para os os meus dois companheiros de palco: “vamos dar o nosso melhor para TODOS”. E todos elogiaram muito o que viram.

Foi um domingo inesquecível. Um marco na minha carreira. O meu primeiro espetáculo em Portugal e já estreio com um Presidente na plateia.

"Assim fez. O Presidente estava na fila para comprar o seu bilhete", Guilherme Trajano, ator brasileiro Marcelo-Rebelo-Sousa-Teatro

Marcelo Rebelo de Sousa “foi uma grata surpresa”, diz o ator Guilherme Trajano

Qual a opinião com que ficou de Presidente Marcelo Rebelo de Sousa? 

Gosto de pessoas simples. Sempre gostei. Ele foi de uma simplicidade e humildade que poucas vezes vi, sobretudo no meio político. Alguns amigos já tinham dito que ele é assim, fala com todos, adora bater papo e ter contato com as pessoas. Foi uma grata surpresa. Agora entendi o porquê de tamanha popularidade e de Marcelo Rebelo de Sousa ter vencido em quase todos os concelhos de Portugal.

Venho de um país onde não existe esse hábito. Dificilmente encontramos um político no teatro. Eu, pelo menos, nunca encontrei e nunca tive nenhum na plateia. No Brasil, a verba para a cultura diminui cada vez mais. Não temos uma política pública para incentivar a arte, a cultura. Infelizmente, a nossa realidade é esta e o atual Presidente cortou ainda mais o dinheiro destinado à nossa área. Ele está mais preocupado com eventos militares. Por isso, não imaginei que pudesse ter o Presidente de um país a prestigiar-me.

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A decisão de vir para Portugal

Guilherme, fala-nos da opção Portugal. Como é que decidiu vir viver para Portugal?

Desde o início de 2018 que eu andava a amadurecer, com a família, a possibilidade de uma mudança para a Europa. Pensámos em Itália ou Portugal. Acabamos por optar por Portugal, pois além da língua, tem um clima parecido com o nosso. Sem contar com os fatores de segurança, educação, saúde, que pesaram também na nossa escolha.

O meu pai é português, e por isso tenho dupla cidadania, ou seja, mais um ponto a favor no momento da escolha entre os dois países. Apesar de a minha esposa ser brasileira e italiana, ela também preferiu a ideia de morar em Portugal, a pensar na adaptação mais fácil da família e tendo em conta a nossa área profissional. Ela é dj e produtora musical e eu sou ator.

Claro que um outro fator muito importante para a nossa mudança está relacionado com o momento “estranho” que o Brasil atravessa. Muita violência: já tive armas pesadas apontadas à minha cabeça, várias vezes.  O desemprego é elevado, há falhas na educação e na saúde. Por diversas vezes, tive que explicar ao meu filho por que razão há tanques de guerra parados na esquina da nossa casa. E nós morávamos no Leblon, bairro do Rio de Janeiro onde o metro quadrado chega a ser mais caro que o de Nova Iorque.

Então, viemos para Lisboa no verão passado e começamos a procurar apartamentos, freguesias nas quais gostaríamos de morar, escolas, e tudo o mais que iríamos precisar para este processo de mudança. Voltamos para o Brasil, organizamos tudo e regressámos. Passamos o Ano Novo a voar, para podermos entrar em Lisboa com o pé direito, no primeiro dia do ano 2019.

Daquilo que já conhece de Portugal, do que mais gosta? 

Ainda não tivemos oportunidade de conhecer Portugal como queremos e desejamos. No verão passado, como viemos com o foco de analisar melhor Lisboa, a pensar na nossa mudança, acabamos por não visitar muitos lugares. O único local onde fomos foi o Porto, para visitar familiares da minha esposa. Adorámos! Muito lindo!

Mas queremos conhecer do Norte ao Sul.  Queremos conhecer tudo. Viajar de carro, conhecer cada pedaço deste país que tem nos acolhido com muito carinho. Estamos a planear conhecer primeiro o arquipélago dos Açores ou da Madeira. Aliás, a Madeira está na rota do meu espetáculo de teatro. Provavelmente, faremos apresentações por lá.

Gastronomia: Estou deliciado com a gastronomia portuguesa. Tenho comido muito bacalhau, porém ainda não experimentei as 1001 maneiras de prepará-lo (risos). Sou muito eclético na hora de escolher algo para comer, gosto de experimentar pratos de todo o mundo.

E do Brasil – do que mais e menos sente falta?

Sinto falta da família e dos amigos. Ainda bem que temos FaceTime. Achei que iria sentir falta da comida brasileira, mas até ao momento isso não aconteceu.

Não sinto a menor falta da bagunça generalizada em que se encontra o Brasil. Eu e a minha esposa dizemos que esta mudança veio na hora certa. E não me venha dizer que abandonei o meu país na hora em que ele precisa mais de mim, porque ainda mantenho vida no Brasil: pago impostos, a minha maior renda vem de lá, voto, gero empregos, tenho empresas e a minha esposa tem uma indústria no sul do país. Ou seja, mesmo estando aqui, colaboramos diariamente para o futuro do Brasil. Já os que comandam não fazem o mesmo. Pronto! Leve desabafo para os hipócritas de plantão.

"Assim fez. O Presidente estava na fila para comprar o seu bilhete", Guilherme Trajano, ator brasileiro Sergio-com-o-filho

Guilherme Trajano com o filho

Posso saber se é pro ou contra Bolsonaro?

Muita gente não sabe, mas além de ser formado em artes cénicas, eu também tenho formação em gestão pública/ciência política. Gosto muito dessa área. Eu sou pró Brasil.

Na minha opinião, a política no Brasil é cíclica e a alternância no poder irá sempre acontecerá. Não acredito que o Presidente será capaz de mudar muita coisa em quatro anos. Muito pouco tempo para um país tão grande e que enfrenta problemas gravíssimos há décadas.

Infelizmente, os nossos governantes, na sua maioria, só pensam no período em que estão sentados nas cadeiras, fazem coisas a pensar nesse período e numa reeleição. Não fazem nada para deixar um legado para as outras gerações.

Falam que o problema é A ou B ou X ou Y mas não pensam que o maior problema a ser resolvido para resolver os demais chama-se educação. A nossa educação deteriora-se cada vez mais, a cada ano que passa. Os problemas que vão sendo resolvidos é para apagar incêndios e não a pensar no futuro do país.

Concluindo, pois a política é um assunto muito delicado: considero que o Presidente está a seguir um caminho errado. Enfrentar as demais esferas é ruim. De que adianta ter parte do povo a seu lado se ele comprar uma briga com quem aprova ou desaprova tudo. Ele já não tem a maioria.

Desejo sorte e sabedoria para Bolsonaro, pois até agora ele não fez absolutamente NADA, a não ser falar besteiras nas redes sociais.

"Assim fez. O Presidente estava na fila para comprar o seu bilhete", Guilherme Trajano, ator brasileiro Conde-Giray

Guilherme Trajano, como Conde Giray

Dama das Camélias

Fale-nos agora do Conde de Giray e da sua peça – os motivos para não perdermos esta peça?

O Conde de Giray (lê-se Girré) surge num momento especial da minha vida. Durante alguns anos, fiquei afastado dos palcos, pois estava focado nos meus empreendimentos.

Quando mudei para cá, decidi que iria voltar a pisar os palcos e, alguns meses depois, aconteceu o convite para dar vida a esta personagem do clássico do romantismo francês “A Dama das Camélias”.

Na adaptação de Roberto Cordovani, ele usou a licença poética para reescrever um Conde um pouco diferente do da literatura.

Sou suspeito, mas o espetáculo eé lindo demais, muito emocionante. São apenas quatro personagens: Marguerite Gautier (Roberto Cordovani), Armand Duval e Jorge Duval – pai de Armand (Marcos Reis) e Conde de Giray (Guilherme Trajano).

Essa adaptação requintada do clássico de Alexandre Duma Filho conta com uma trilha sonora original e com figurinos da Maison Dior e Chanel.

São alguns espetáculos em um só. A luz é um espetáculo à parte, muito bem desenhada pelo Roberto. O cenário minimalista também é uma atração à parte.

O teatro esteve em palco no Teatro Gil Vicente em Cascais até ao dia 30 de junho.

 

"Assim fez. O Presidente estava na fila para comprar o seu bilhete", Guilherme Trajano, ator brasileiro Conde-Giray-Dama-das-Camélias

Da sua experiência artística, perguntamos-lhe como foi interpretar Jesus Cristo? A cena mais desafiante? O que passou a saber e que por exemplo desconhecia sobre a história de Jesus?

Foi uma emoção indescritível. Interpretei Jesus Cristo numa das maiores montagens da Paixão de Cristo do Brasil. Sinto muita gratidão por ter tido essa oportunidade, talvez uma das mais importantes da minha carreira, nestes quase 20 anos como ator profissional.

A cena mais desafiante foi a da Via Crúcis quando, na terceira estação, Jesus cai pela primeira vez no chão, carregando a cruz. A cruz era pesada e, naquele momento, o meu corpo ficou dormente, senti um zumbido nos ouvidos e um arrepio dos pés à cabeça. Uma sensação que nunca tinha sentido. Foi emocionante.

Sou católico, e por isso já conhecia sobre a história de Jesus Cristo. Mas com este trabalho que realizei, passei a saber mais sobre o exercício da Via Sacra, as suas estações, e inclusive, que existe em Fátima a 15ª estação (lembrança a ressurreição de Jesus), estação essa que foi sugerida pelo Papa João Paulo II, que é opcional, diferente das 14 estações tradicionais.

Novos projetos em Portugal – o que gostaria de fazer?

Após esta temporada em Cascais, o espetáculo vai para São Paulo e regressará a Portugal e a Espanha no final do ano, início de 2020.

Tenho procurado manter-me atualizado como ator, fazendo cursos e estando sempre preparado para qualquer oportunidade.

Quero fazer mais teatro aqui em Portugal, com certeza. Tenho tentado oportunidades na televisão também. Estou a fazer uma novela brasileira, que é transmitida atualmente na CMTV, e outra no Brasil, na Record. A RTP também já exibiu uma novela em que eu participo. Quero estrear-me em produções portuguesas. Aceito convites para testes (risos).

Após o verão, gravo uma série, mas ainda não posso dar mais detalhes. Em breve contactar-vos-ei em primeira mão.

 

"Assim fez. O Presidente estava na fila para comprar o seu bilhete", Guilherme Trajano, ator brasileiro Sergio-Trajano-Corações-Brasil

Guilherme Trajano, na novela Caminhos do Coração, que está no ar no Brasil

 

As escolhas do ator Guilherme Trajano

Um prato… Estou deliciado com a gastronomia portuguesa. Tenho comido muito bacalhau, porém ainda não experimentei as 1001 maneiras de prepará-lo (risos).

Spots para comer e beber em Portugal…. Ora aí está uma das coisas de que mais gosto além de viajar – conhecer restaurantes. Gosto de comer uma tosta num café do Bairro Alto, tomar um brunch no Nicolau, fazer uma refeição vegana no My Mother’s Daughters, uma refeição japonesa no GoJuu, hambúrgueres no Ground Burguer, culinária francesa no JNcQUOI, tomar uma bebida em frente ao rio, no SUD, e em toda e qualquer tasca deliciosa que existe aos montes pelas esquinas de Portugal.

Praias… Não sou muito fã de praias. Ainda tenho apartamento no Rio de Janeiro, mas não sou de frequentar praias. Mas queremos conhecer o Algarve, todos dizem que é lindo.
O nosso litoral no Brasil é lindíssimo, desde o Sul ao Nordeste. E na Europa já conheci e adoro algumas praias: em St Tropez, Ibiza, Myconos, Santorini. Na Ásia, as praias em Phuket, Ko Samui (Tailândia), Boracay (Filipinas), e na Oceania, praias como Bondi Beach em Siney e Piha na Nova Zelândia.
Imaginem se eu fosse fã de praia? (risos)

Ainda quero conhecer muitas mais. Alguma dica? (risos)

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