Tomar recebeu o último espetáculo de Monólogos com este elenco, um trio composto por mim, pela Carla Andrino e pela Vera Kolodzig. Tomar encerra um ano de casas cheias pelo país fora. Um país que, tantas vezes me surpreendeu, pelas salas espantosas e pelo público ávido de momentos culturais, acolhedor, motivador, anfitriões inexcedíveis. Mais mulheres que homens na plateia, ainda que os Monólogos sejam uma conversa para todos. Uma oportunidade para explorar relacionamentos e vivências atuais que partem do desconcertante universo feminino.
Foi um ano sem fins de semana. Repleto de experiência únicas. E também de imprevistos. Um deles aconteceu em pleno espetáculo. Na plateia, alguém grita repetidamente “112”. A minha primeira reação: “trata-se de um momento ‘Apanhados’ para a televisão. Alguém me quer pregar uma partida”. Até que uma clareira se abre no auditório e deixa entrever uma mulher desmaiada. Depois de socorrida e levada pela equipa médica, havia que dar continuidade ao espetáculo. A Paula Neves, a minha mestra das tábuas, perguntou-me se estava preparada. E eu, atrevida, propus-me a recomeçar o texto exatamente no momento em que o tinha interrompido. Não imaginava o quanto difícil é esta tarefa. Mas, com a ajuda do público, voltei a “entrar” no workshop da vagina.
Há mais imprevistos. O da cortina de veludo, por exemplo, que certo dia, absorveu a fumaça de palco usada para produzir o efeito de névoa. Diga-se que, nessa noite, quando a cortina subiu, os meus esforços para não tossir foram hercúleos. Foi nessa noite que a Paula partilhou comigo uma informação essencial do mundo do espetáculo: quando um ator precisa de beber água, simplesmente sai de palco e volta subtilmente a entrar. Desconhecia. Podia estar à beira do colapso que ficaria ali sentada, sem saber como proceder.
Mais divertido foi o episódio do exame ginecológico, o momento do texto que me leva a interagir com o público. E lá diz um senhor na plateia: “veja lá o que me vai perguntar – aviso já que eu trabalho num consultório de ginecologia”. A minha resposta imediata: “veja lá que sempre temi que me acontecesse isto. Hoje é o dia”.
Aprendi que no teatro oferecem-se presentes aos colegas. Impossível esquecer as bolachas artesanais da Paula Neves, a iluminura da Joana Pais de Brito, a flor da Vera Kolodzig, a música da Carla Andrino. E as voltas que eu dei à última da hora, em busca de ofertas/pequenos mimos, quando soube que a estreia é antecedida por esta partilha tão bonita.
Foi um ano sem fins de semana. Foi um ano difícil que coincidiu com uma situação muito difícil a nível pessoal, o AVC da minha mãe.
Mas hoje olho para trás e sei que valeu a pena. Agradeço à Yellow Star Company a sua imensa paciência para com as minhas necessidades. Agradeço a tolerância do encenador Paulo Sousa e Costa – só o seu encorajamento me levou a enfrentar este desafio que, em certos momentos, me pareceu intransponível.
Agradeço ainda, de coração cheio, a cada um dos mais de 20 mil espetadores que assistiram aos Monólogos. A eles, estou profundamente agradecida por me terem acompanhado e apoiado naquele que considero ter sido o meu maior desafio do ano 2019. E assim cai o pano. Com gratidão.