Casar só aos 18 anos

Casar? Só depois dos 18 anos

Há notícias que não podem passar despercebidas. Esta vitória aconteceu há semanas, no final do ano passado (outubro 2019). Aconteceu tarde. O casamento prematuro expõe as raparigas a doenças graves como HIV/SIDA, e aumenta a mortalidade maternal e infantil. O casamento prematuro tira as raparigas da escola antes do tempo. O casamento prematuro é uma tradição em Moçambique (afetando quase uma em  cada duas raparigas), país com uma das taxas mais elevadas de casamento prematuro do mundo. E nós não devemos seguir nenhuma tradição que vá contra os direitos humanos. Esta lei aconteceu tarde. Mas aconteceu. E não pode passar despercebida.  

 

Casar? Só depois dos 18 anos Uni

Unicef – Campanha Casar só depois dos 18 anos

“Foi promulgada a Lei de Prevenção e Combate às Uniões Prematuras, pelo Presidente da República de Moçambique, Filipe Nyusi, na segunda-feira (14).
A referida lei já havia sido aprovada pela Assembleia da República no mês de Julho de 2019, faltando ainda a sua promulgação.
Este acto é um marco histórico para as organizações da sociedade civil moçambicanas e internacionais que trabalham na área de promoção e protecção da criança em Moçambique.
Nasce agora uma nova etapa e desafios para o governo e parceiros no que concerne a divulgação e disseminação desta lei para que a toda a população possa conhecer e proteger as raparigas contra as uniões prematuras.
Mudar somente as leis não vai acabar com as uniões prematuras, é preciso também mudar as condições, atitudes e comportamentos da população, e vamos continuar a trabalhar arduamente para tal.”
#endchildmarriage #childmarriage

 

A história do casamento prematuro da Mariamo, retratada pela UNICEF

“Depois de ter feito os ritos de iniciação*, os meus pais me aconselharam a casar. Eles disseram que eu teria uma vida melhor, que o meu marido iria dar-me tudo o que eu quisesse. Eu queria obedecer aos meus pais, e então casei-me. Eu tinha 14 anos,” diz Mariamo Omar Ambasse Age, de 17 anos de idade.

Mariamo nasceu no distrito de Angoche, na província de Nampula. Vive numa comunidade pequena, a casa é de construção precária e quando chove a água da chuva entra dentro de sua casa. Tem uma família grande, composta por 3 irmãos e 3 irmãs. Mariamo é a menina mais nova da família. Os seus pais sobrevivem da agricultura e pesca, a sua mãe trabalha numa “machamba” familiar e o seu pai é pescador.

Mariamo gosta muito de estudar, e sonha em ser uma advogada, sonho este que foi interrompido quando frequentava a 10ª classe, quando os seus pais a convenceram a casar-se com um homem de 36 anos com a perspectiva de melhorar a sua vida e da família.

“Eu pensava que fosse ter uma vida melhor depois de casar, que não ia faltar comida, mas havia dias que não tinha o que comer e nem sabia o que iria comer no dia seguinte. O meu marido não me disse para parar de estudar, mas fui obrigada a deixar a escola para poder trabalhar e ajudar a sustentar-nos. Eu vendia amendoim na rua e com o pouco dinheiro comprava comida,” lembra Mariamo do tempo em que era casada.

Certo dia Mariamo escutou na Rádio Comunitária de Parapato um programa sobre casamentos prematuros. “Eu não sabia o que eram casamentos prematuros, não sabia que eu estava num. Ao escutar na rádio eu soube que era errado, e o que fazer para sair do meu casamento”.

Mariamo decidiu contactar a responsável do programa de rádio e contou a sua história, “a senhora Arminda da rádio perguntou-me se eu queria sair do meu casamento, e eu disse que sim, porque queria voltar a estudar.” A rádio levou a Mariamo ao Gabinete de Atendimento da Mulher e da Criança em Angoche e chamou os seus pais. “Perguntaram aos meus pais o que eles ganharam em casar-me criança, e os meus pais disseram que não tiveram benefícios, só queriam que eu vivesse uma vida melhor, não sabiam que ia sofrer. Eles disseram que estavam arrependidos e gostariam de me ver de volta à escola.”

A Rádio Parapato e o Gabinete ajudaram Mariamo a sair do seu casamento e a voltar à escola, deram-lhe também material escolar porque os seus pais não tinham condições.

Hoje Mariamo está a concluir a 11ª classe, e quer ser advogada. “Quero ser advogada para poder ajudar as crianças a defender os direitos delas, e evitar que outras meninas passem pelo que eu passei, porque já estou cansada de injustiça.”

A Rádio Parapato ajudou 7 meninas a saírem de casamentos prematuros e a sonhar com um futuro melhor. O Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) tem apoiado, através do Fórum Nacional de Rádios Comunitárias (FORCOM) e do Instituto de Comunicação Social (ICS), na produção de programas radiofónicos semanais em Português e nas línguas nacionais em cerca de 60 rádios comunitárias, incluindo a Rádio Parapato. O UNICEF também apoia na produção de programas de rádio de Criança-para-Criança, que são programas de rádio concebidos e produzidos por crianças para crianças, plataformas importantes para a participação e engajamento delas.

“Eu acho um pesadelo casar enquanto criança. Para as meninas que estão casadas, eu peço que não deixem de lutar pelos seus sonhos, peçam ajuda e saiam do vosso casamento. Não abandonem a vossa educação, o vosso futuro depende dos estudos. Quero agradecer a Rádio Parapato por ter-me ajudado a voltar a sonhar,” concluiu Mariamo com um olhar determinado.

Comentários

comentários