Crónica de Magda Fernandes
Mulher, Mãe, Advogada. De Bem com a Vida.
Abdullah al-Mohamed inventou um jogo para que a filha de três anos não tenha medo de cada vez que ouve uma explosão, na Síria. Pai e filha riem-se sempre que ouvem o barulho das bombas. Nós por cá? Andamos a discutir o sexo dos anjos. Nós por cá não temos bombas. Andamos a correr para o supermercado, a gritar aos miúdos para se despacharem, a assobiar jogadores e a dizer que o país vai muito mal. Esquerda e direita e direita e esquerda. E o país vai mesmo muito mal e ninguém aguenta isto. Pois é, nós por cá não somos sírios. Não precisamos de encontrar formas inovadoras do fundo das nossas entranhas de medo para dar alegria aos nossos filhos no meio de uma bomba. É engraçado como a nossa resiliência e amor se medem pelas circunstâncias em que vivemos. Este pai sírio que dá gargalhadas ao som das bombas não estará muito preocupado com jogos de futebol nem se a criança vai bem vestida e lavada para a escola. Que isto fique registado na nossa memória da próxima vez que acharmos que o país está mesmo mal e que já não aguentamos a nossa rotina trabalho casa supermercado etc. Se um dia tivermos de erguer o riso ao som de uma bomba para afastar o medo dos nossos filhos, talvez toda a rotina tão importante que nos consome seja uma espécie de oásis. É melhor agradecer aos sírios estas chamadas de atenção, enquanto podemos fazê-lo sem aumentar a gargalhada.
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