Um estudo publicado na revista médica britânica The Lancet, e divulgado este mês, revela que a maioria dos doentes covid-19 continuou a ter, pelo menos, um sintoma seis meses após a alta hospitalar, sendo a fadiga ou a fraqueza muscular o mais apontado. O estudo foi realizado com 1.655 doentes covid-19 que tiveram alta do Hospital Jin Yin-tan, em Wuhan, na China, onde foi detetada pela primeira vez a infeção, em dezembro de 2019.
Sofia Almeida garante que este é também o seu caso.
Em Março do ano passado, quando se registaram os primeiros casos de COVID-19 em Portugal, Sofia Almeida, 42 anos, queixou-se do que aparentava ser uma crise habitual de asma. Perante a severidade dos sintomas, reforçou a medicação com terapêutica inalatória (bombas) e cortisona. A médica de família chegou também a prescrever-lhe antibiótico. Ainda assim, a tosse, a falta de ar e o mal-estar persistiram. Face às notícias da evolução do número de infetados com COVID-19, a médica recomendou-lhe que fizesse o teste: “mas eu não queria sair de casa para ir fazer o teste, com receio de ser infetada no hospital e contagiar as minhas filhas e os meus pais, doentes de risco”. Ao fim de um mês de sintomas, a crise apertou e Sofia foi transportada pelo INEM para o hospital de Santarém, onde viria a testar positivo. “Foi um choque muito grande. Assim que soube o resultado do teste, entrei em pânico. Só pensava na minha família: ‘Ai meu Deus que eu mato a minha família'”, recorda.
Foram três semanas “muito difíceis” de internamento: “cheguei a um ponto em que, de tanto ser picada, deixei de ter veias que permitissem receber o antibiótico por esta via. Passou a ser oral. Tive momentos de muita angústia. E os enfermeiros, que apenas conhecia com máscara, agarravam-me com força nas mãos, como que a darem-me força, olhos nos olhos. Só quem passa por aqueles corredores consegue imaginar o sofrimento”.
Após dois testes negativos, regressou a casa. Mas nunca mais foi a mesma: “a Covid-19 deixou-me sequelas. Os exames que fiz depois do internamento mostram alterações nos pulmões. E a fragilidade a nível do tórax faz com que sinta dor, todos os dias, e tenha dificuldade em respirar. Os médicos não sabem até que ponto foi provocado pela COVID-19. Dizem que há muita coisa que ainda não se sabe…”, revela.
Por duas vezes, Sofia tentou regressar ao trabalho. Da primeira vez, seguia diretamente para o hospital, com mal estar e dificuldades respiratórias. Da segunda, aguentou-se 15 dias, mas as forças faltaram-lhe. “Será que aquilo que eu sinto vai passar algum dia?, pergunto-me? Será que eu vou ficar assim para sempre, sem conseguir trabalhar? Se assim for, nunca mais serei a mesma pessoa”.
Sofia Almeida é motorista de pesados, uma profissão de que gosta muito, e da qual tem saudades: “adoro trabalhar. O meu dia a dia passava por transportar produtos para hipermercados. Não é uma função fácil, uma vez que falamos de paletes muito pesadas. Mas é algo que eu sempre gostei de fazer”, refere.
“Sinto neste momento uma revolta muito grande. Sinto uma fadiga enorme, não consigo falar durante muito tempo e até ao almoço faço um intervalo, porque canso-me a comer. Tenho que estar o máximo resguardada, mas as minhas filhas continuam a frequentar as escolas, as quais têm cada vez mais infetados. Há dias, a professora da minha filha testou positivo e voltámos à angústia dos testes. Nestas circunstâncias, as escolas têm que encerrar. Estou revoltada porque sinto que as pessoas andam a gozar com a ‘gripezinha’, e eu sem conseguir respirar bem desde março”, partilha Sofia.