Mo Gawdat, engenheiro de formação e Chief Business Officer da Google, esteve em Portugal para lançar “A equação da felicidade”. Este livro nasce daquele que foi o mais duro teste à sua felicidade: Ali, o seu filho e também o seu melhor amigo, morreu numa operação de rotina à apendicite, devido a um erro médico.
Mo ficou destroçado, desamparado. “Como poderei viver sem ti?”, perguntava. O que responderia Ali? Mo sabia a resposta. E reuniu todas suas forças para se dedicar a esta equação. Hoje recebe milhares de mensagens de pessoas agradecidas pela partilha da “fórmula da felicidade”. Isso traz Ali de volta?, coloca-me a pergunta. Não, responde com precisão. Mas este livro leva Ali ainda para junto de mais pessoas. Ali está em todo o lado e faz parte de cada um. E isso faz-me feliz.
Neste vídeo, o autor assina: “Júlia, vamos fazer todos felizes em Portugal?”
Em 2014, o jovem Ali estava a estudar na Faculdade em Boston e, antes de preparar uma viagem pela América do Norte, comunicou aos pais que iria a casa, ao Dubai, para estar com a família. Nessa estadia, Ali queixou-se de uma enorme dor e deu entrada no hospital, onde os médicos detetaram uma apendicite e indicaram a necessidade de cirurgia. Nada de preocupante, aparentemente.
“Quando Ali estava na mesa de operações, foi-lhe induzida uma seringa para insuflar dióxido de carbono. Porém, a agulha foi empurrada uns milímetros a mais, perfurando a artéria femoral, um dos principais vasos que transportam sangue vindo do coração. E em poucas horas, o meu querido filho partiu”, escreve Mo no seu livro.
“Diz-se que perder um filho é a experiência mais terrível que alguém pode enfrentar. Como é óbvio, abala qualquer progenitor até ao seu âmago. Perder Ali na sua juventude era ainda mais duro, mas perdê-lo inesperadamente e devido a um erro humano deve ter sido o pior de tudo.
A perda foi ainda mais devastadora, já que ele não era apenas o meu filho, mas também era o meu melhor amigo. Aos 18 anos, Ali era notoriamente mais sábio do que muitos homens que eu conhecia. Era um apoio e um confidente. Por vezes, eu até dava comigo mesmo a pensar: Quando crescer, quero ser exatamente como Ali.”
Nos dias que se seguiram à cerimónia fúnebre, Mo só pensava: O que faria Ali nesta situação? “Todos nós, que o conhecíamos, lhe pedíamos regularmente um conselho, mas agora ele já não estava ali connosco. Queria desesperadamente perguntar-lhe: ‘Como poderei viver sem ti? Muito embora soubesse a sua resposta. Dir-me-ia apenas: “khalas ya papa” – Acabou, papá – Morri. Não podes fazer nada para que isso mude, portanto tenta que tudo seja o melhor possível”.
Em momentos de silencio, Mo conseguia não ouvir mais nada senão Ali a repetir continuamente estas frases na sua cabeça.
E assim, em 17 dias após a sua morte, começou a escrever. “Decidi seguir o seu conselho e fazer algo de positivo, tentar partilhar o nosso modelo de felicidade.
Não sou um sábio nem um monge. Porém, encontrei um modelo que funciona. Um modelo que Ali, com o seu exemplo, ajudou a gerar”.
Mas Mo… como é que se supera a perda, pergunto.
“Como é que eu superei a perda do Ali? Eu nunca superei a perda do Ali. Nunca superamos a perda de um filho, tal não é possível. Não há um dia em que não pense nele. Mas há uma diferença entre dor e infelicidade”, responde o engenheiro.
Quando Ali partiu, Mo sentou-se a reunir as hipóteses que tinha em cima da mesa: “Tinha a hipótese de chorar e chorar e chorar para o resto da minha vida. E pensei: o Ali não vai voltar. Será que há uma forma de eu conseguir sentir-me um pouco melhor amanhã?
E foi assim que comecei esta fórmula. Já recebi milhares de mensagens a agradecer e a dizer: salvou a minha vida. Isso traz o Ali de volta? Não. Mas pelo menos ele não se foi embora por nada.
Costuma-se dizer: uma vida por uma vida. Neste caso, é uma vida por 10 milhões de vida”.
E a queixa, Mo? Muitos pais estarão a pensar: por que não apresentou a queixa em tribunal?
“Muitas pessoas questionam se eu sugiro que não devemos reclamar. Claro que sim. O hospital foi investigado, o médico foi despedido.
Mas tenho que dizer-lhe isto francamente. Há duas formas de encarar e pensar no que aconteceu. E uma delas é: ‘o médico matou o meu filho’. E agora vou partilhar um técnica consigo. Sempre que tenho um pensamento que me faz sentir dor ou infeliz, eu pergunto imediatamente ao meu cérebro: cérebro, isto é verdade?
Que medico acorda de manhã e diz: eu hoje vou matar um paciente e destruir toda a minha carreira.
Isto é verdade?
Este homem viu a dor do meu filho e queria salvá-lo. Eu investiguei: ele já tinha feito 423 cirurgias semelhantes a esta. Mas há que saber mais outra coisa acerca deste homem: Ele é humano. E os humanos cometem erros”.
Obrigada Ali, por tudo o que me mostraste, pelo amor que me fizeste sentir e por me teres dado uma razão para escrever. Continua feliz até nos reencontrarmos, quando o meu trabalho aqui estiver terminado.
Porque é que a felicidade é um desafio tão grande?
“Numa altura em que as condições de vida são muito melhores quando comparadas com há 100 anos, porque é a felicidade um desafio gigante? Temos iphones, carros, televisões. Tudo parece melhor. Hoje temos supermercados cheios. Antes costumávamos caçar.
Todos os momentos na nossa vida em que nos sentimos infelizes não se deve a um episódio específico. Deve-se àquilo que gostaríamos que tivesse sido esse episodio especifico. Deve-se às expetativas.
Na verdade, a felicidade vem de dentro. O que temos de material em criança? Nada. A felicidade vem de dentro. Mas de repente começámos a pensar que a felicidade vem com um novo carro ou com uma namorada nova.
É como aquela situação frequente de nos esquecermos da chave do carro e voltarmos a casa para procurar. Não está em lado nenhum, nem dentro do frigorífico. Mas onde é que estão? Estão no bolso. É o que acontece com a felicidade quando a procuramos nos bens materiais. E ela está lá, onde sempre esteve.
A pesquisa cientifica diz-nos que há uma relação entre dinheiro e felicidade, mas apenas quando não estão satisfeitas as necessidades básicas. Quando não estão satisfeitas as necessidades básicas, quanto mais dinheiro temos, mais felizes somos. A partir dessa linha, não há relação.”
Aprendi muita coisa com o meu filho Ali.
Uma delas era perguntar sempre porquê. Eles perguntava sempre porquê quando lhe mandava fazer algo. Uma vez disse-lhe: ‘Ali eu quero que tires um A a matemática’. Ali respondeu: Papa, se eu te der duas hipóteses – aprender matemática e ter um C ou não aprender matemática e arranjar maneira de ter um A, qual destas hipóteses escolherias? E a verdade é que motivamos as nossas crianças pela negativa. Ele adorava matemática – e queria simplesmente aprender algo que adorava.
Uma canção
Após a morte de Ali, Mo lembrou-se de uma canção que ambos adoravam. E não descansou enquanto não a voltou a descobrir. Era uma canção escrita por Jonathan Coulton e cantada por Ellene McLain, para um jogo de computador que Mo e Ali costumavam jogar juntos.
Mo voltou a ouvi-la. E quando o fez, o engenheiro conta que as peças/letras começaram como que a encaixarem-se:
Letra da Música
But there’s no sense crying over every mistake.
You just keep on trying til you run out of cake”
A interpretação de MO: Não fiques preso, a chorar por causa do erro humano que me tirou a vida. Continua, até que o teu tempo chegue ao fim. Concentra-te na vida e faz o bem. É assim que deverás passar o resto do teu tempo. Segue em frente.
I’m not even angry.
O meu maravilhoso filho perdoou – como sempre.
And believe me I am still alive
Sei que estás vivo. Tenho a certeza de que estás feliz, onde quer que te encontres – a conversar com as pessoas mais interessantes que já viveram.
