“O homem inseguro não aceita uma mulher que se opõe a ele e continua a dominá-la”, Sveva Casati Modignani
Suite 405 chegou às bancas. É um livro sobre a crise económica que a Itália atravessa, abordada através da história de amor entre a jovem francesa Léonie (casada com um empresário italiano do qual tem 5 filhos) e o médico Roger, o seu amante. Desde há 28 anos, que este casal se encontra apenas um dia por ano.
Sveva Casati Modignani, cuja primeira obra editada em Portugal foi Baunilha e Chocolate, é autora best-seller: os seus romances estão traduzidos em 20 países e venderam mais de 11 milhões de exemplares. Vive em Milão, de onde nos responde, em italiano, a estas questões. Uma conversa sobre trabalho, escrita, amor e, como não poderia faltar, as mulheres. São elas que mais lêem os seus romances, embora contem a Sveva que também, embora nem sempre reconhecendo, também os maridos são seus leitores.
Suite 405 – como lhe surgiu a ideia deste livro?
A ideia deste livro ocorreu-me enquanto pensava na falta de trabalho e no desemprego, que está a aumentar em Itália. Questionava-me acerca do que poderia ser feito e quais as dificuldades que os trabalhadores encontram nesta Itália que continua em recessão. Foi assim que decidi recorrer ao sindicalista mais confiável. Ele chama-se Maurizio Landini e contou-me a realidade do mundo do trabalho. Levou-me às assembleias sindicais e colocou-me em contacto com os trabalhadores e com os empresários.
Durante essa viagem até ao mundo de fábrica, em que marcou presença em assembleias e reuniões sindicalistas, o que mais a impressionou?
Uma das coisas que mais me impressionou foi o esforço, o trabalho contínuo dos trabalhadores – e de todos os que têm a sorte de trabalhar. Por maior que seja a segurança no trabalho, a verdade é que na Itália, todos os dias morre um trabalhador. Outra questão que me impressionou está relacionada com a maior atualização no trabalho: o trabalho mudou, a evolução digital implicou novas estratégias e os trabalhadores tornam-se cada vez mais técnicos. Mas acontece que as empresas não querem gastar dinheiro em cursos de atualização.
Sente que o trabalho, o tema deste seu livro, não é reconhecido em Milão?
Diria que não é reconhecido em Itália. Penso que a política atual está preocupada com a chegada de imigrantes e acaba por ignorar as muitas empresas que deslocam as suas atividades para o exterior, aumentando assim o número de desempregados.
Conta que gosta de livros autobiográficos (aliás, foi por aí que começou a carreira de escritora). Que episódios autobiográficos foram mais difíceis de escrever?
Nenhum, esse episódios vieram até mim, no limite da memória. Seguindo-os, refiz a minha vida e contei-os para explicar ao leitor como comecei a escrever romances.
É uma escritora muito admirada no mundo inteiro. Portugal não é exceção. Qual o maior elogio que já recebeu dos seus fãs?
O melhor elogio que recebi foi o de uma freira do departamento de oncologia do hospital de Brescia (Itália). Ela disse-me que os meus romances são muito bons livros para as mulheres que sofrem.
As mulheres estão sempre presentes. Numa entrevista, disse que “os homens não gostam de mulheres que sejam proativas, autónomas, firmes, preferem mulheres fracas”.
E que alguns “homens usaram sempre o trabalho como arma de chantagem”, fazendo uso da sua força física? Mas esta realidade está a mudar?
As mulheres das novas gerações são muito mais autónomas que as das gerações que as precederam: todas elas trabalham, todas têm consciência da sua dignidade e estão menos dispostas a sofrer a arrogância do homem, quando têm a infelicidade de encontrar alguém violento. E isso também explica o crescente fenómeno dos feminicídios (assassínio de mulher ou rapariga), porque o homem inseguro não aceita uma mulher que se opõe a ele e continua a dominá-la; ele não encontra outro recurso, senão eliminá-la.
“Uma mulher pode estar casada 50 anos e o marido nunca a conhecerá”. Ou seja, nós mulheres somos…?
Nós, mulheres, somos muito mais complicadas que os homens. E esta é uma das belezas das mulheres.
Ph credits Gianmarco Chieregato