Crónica Educar pela positiva

“Vamos deixar de assobiar para o lado e de fingir que não vemos os outros?”, Crónica de Nuno Pinto Martins

“Desculpe incomodar, só lhe quero dizer que está de parabéns”.

Crónica de Nuno Pinto Martins*
*Pai. Formador. Autor do livro Educar pela Positiva. Fundador da Academia Educar pela Positiva: 
De Bem com a Vida

Quando cheguei com a minha filha ao parque infantil, assisti a uma cena digna de um filme. Sentado no baloiço, um menino de 3 anos e pouco chorava, gritava e esperneava energicamente, enquanto a mãe tentava convencê-lo a sair. Ela fez o que melhor que podia: manteve a calma e, com um tom firme mas tranquilo ao mesmo tempo, tentou resolver a situação.

Enquanto todos os outros pais e mães, que eram bastantes por ali, fizeram por ignorar a situação, eu tentei captar o olhar dela para lhe passar alguma solidariedade, mas ela estava demasiado ocupada naquela luta de poderes para sequer dar por mim.

Apesar das tentativas, a criança não saiu do baloiço. A calma daquela mãe foi notável, mas não evitou algum desconforto pelo triste “espetáculo”, como que a pedir desculpa aos demais presentes.

Tive vontade de a ajudar, devia estar a sentir-se envergonhada, perdida, a pior mãe do mundo. Mas não consegui vencer a inércia. Afinal, não era da minha conta.

Com firmeza mas sem gritar, aquela mãe pegou no filho e levou-o para o carro. Ele continuou a gritar e a espernear, como se estivessem a matá-lo.

Quando aquela mãe tentava sentar o filho na cadeirinha do carro, a muito custo, respirei fundo e fui ter com ela.

“Desculpe incomodar, só lhe quero dizer que está de parabéns”. Ela olhou para mim, espantada, talvez a pensar que eu estaria a gozar com ela. Sorri com confiança e acrescentei: “sei que não parece, mas está a fazer um ótimo trabalho”. Ela baixou os olhos e… desfez-se em lágrimas. Dei-lhe um abraço espontâneo e saí de cena. “Nem imagina como eu precisava se ouvir isso agora”, disse-me enquanto me afastava. Olhei para trás, sorri e arranquei.

Aquela mãe podia ter-me mandado dar uma curva, ou ter-me ignorado, mas aceitou que um desconhecido entrasse no seu mundo. Vamos deixar de assobiar para o lado e de fingir que não vemos os outros?

Foto destaque: Photo by Olivia Bauso on Unsplash
Crónica originalmente partilhada na página Escolas Alternativas e partilhada também com Júlia, pelo autor

Comentários

comentários