Escrever Direito por Linhas Tortas, Livro Joana Rombert

“É sempre difícil aceitar que os filhos têm dificuldades”, Joana Rombert

Escrever Direito por Linhas Tortas é o livro que acaba de ser publicado por Joana Rombert e é também o ponto de partida para uma conversa, com a autora, sobre família e aprendizagem.

A terapeuta da fala, que integra a Unidade de Neurodesenvolvimento do Hospital de Santa Maria, diz-nos que é preciso aliviar a pressão dos pais, relacionada às conquistas que a criança ainda não fez, e que quando a aprendizagem está ligada ao afeto…. é mais fácil aprender.

O livro que a Joana acabou de lançar, «Escrever direito por linhas tortas», está recheado de exercícios apelativos e divertidos. A aprendizagem hoje em dia exige estas vertentes? Qual a forma mais eficaz de aprender?

Cada criança tem a sua forma de aprender, podendo preferir ou privilegiar uma modalidade sensorial para o fazer. As crianças mais visuais ou imaginativas entendem melhor por imagens, as auditivas por informação dada pelo som e as táctil-quinestésicas precisam de experimentar, sentir, tocar e movimentar-se para aprender de forma dinâmica.

Neste sentido, é importante que a aprendizagem recorra ao uso integrado de estratégias multissensoriais, envolvendo as diferentes modalidades, ajudando as crianças a consolidar e reter informação, de forma mais eficaz e duradoura, ficando armazenada mais tempo na memória de longo prazo (“armazém do conhecimento”).

Neste tipo de abordagem multissensorial, o cérebro activa em simultâneo diferentes vias para a tomada de conhecimento, emergindo novas formas de pensar, adaptando-se ao estilo e ritmo da criança.

Desta forma, as crianças aprendem mais naturalmente, divertem-se e envolvem-se mais, desenvolvem competências criativas, de imaginação, melhorando a expressão das emoções, potenciando sensações mais positivas e uma forte motivação para aprender.

"É sempre difícil aceitar que os filhos têm dificuldades", Joana Rombert Joana-Rombert-Autora

Joana Rombert

Quais são os padrões temporais de aprendizagem da leitura e da escrita nas crianças? 

Os primeiros anos da vida, até aos seis anos de idade, constituem um período decisivo do desenvolvimento da criança, sendo essenciais no processo de aprendizagem de leitura e escrita.

Na verdade, os primeiros passos na leitura e escrita, ocorrem desde muito cedo, em idade pré-escolar, ainda antes do ensino formal da leitura e escrita. A estes primeiros passos chamamos literacia precoce ou emergente, que se refere a um conjunto de experiências, práticas e interacções com a leitura e escrita, ajudando ao desenvolvimento posterior das competências de fala, leitura, escrita e cálculo.

É essencial que a criança viva num ambiente de literacia rico rodeada de  livros, jornais ou revistas, para que possa mexer, folhear, escutar histórias em voz alta e expressiva, falar sobre cada história, promover o gosto por canções, poemas, rimas, lenga-lengas, ter acesso a lápis e canetas para poder rabiscar, desenhar e escrever o seu nome. É nos desenhos que criança inclui marcas referentes à escrita, dependendo da sua idade e do seu nível de desenvolvimento. Gradualmente vai tendo a capacidade de distinguir desenhos, de números e palavras escritas.

Os ambientes familiares onde os pais estão atentos a estas questões possibilitam que a criança se relacione de forma mais saudável com a leitura e escrita, motivando-a, encorajando-a e tornando-a mais confiante e competente na sua aquisição futura.

Neste sentido, o ritmo de aprendizagem de cada criança é único e difere de acordo com o seu contexto familiar e de literacia. É isto que explica o facto de algumas crianças entrarem para o 1º ano já a saber ler, a conseguir decifrar palavras enquanto outras ainda estão a aprender as letras e só o conseguem fazer por volta dos 7 anos de idade. No entanto, entre o final do 1º e 2º ano a maioria das crianças é competente a ler e escrever.

É importante que a escola e a família trabalhem em conjunto, dando espaço àquela criança, respeitando o seu ritmo de desenvolvimento, o tempo de aprendizagem, valorizando as suas tentativas, compreendendo os seus avanços, e demonstrando que acredita que irá ter sucesso nesta área.

Que significado pode ter o facto de uma criança não se encaixar nesses padrões? Tem a ver com fatores físicos, sociais…?

Existem tempos próprios para cada criança aprender a ler e escrever. No final do primeiro período do 2º ano, todas as crianças devem ser capazes de descodificar, ler com fluência e compreender um texto, assim como produzir textos escritos ainda que seja comum existirem alguns erros de ortografia. Neste sentido, se a criança apresenta dificuldades a estes níveis, é essencial procurar ajuda especializada junto de uma equipa multidisciplinar que inclui professor do ensino especial, pediatras, pediatras do neurodesenvolvimento, pedopsiquiatra, terapeutas da fala, psicólogos ou terapeutas ocupacionais.

Em regra, se uma criança com problemas de escrita ou aprendizagem não for acompanhada, os problemas persistem e determinam a sua vida futura, ou podem passar por si só? O que acontecia antes de pessoas como a Joana Rombert estarem disponíveis, ou se falar destes temas como se fala hoje? 

É essencial estar atento a cada etapa do desenvolvimento da criança, aos sinais de alarme, desde o pré-escolar, para intervir precocemente minimizando as suas dificuldades. E quanto mais cedo forem identificadas as dificuldades da criança, mais rapidamente ela é capaz de acompanhar os colegas e avançar na sua aprendizagem mantendo a motivação. Cada vez mais temos professores e pais que estão mais atentos às dificuldades dos filhos.

Pela sua experiência em consulta, como reagem os pais às dificuldades de aprendizagem dos filhos? Existe uma pressão sobre a criança, ou até uma pressão social que os pais colocam sobre si próprios pelo facto de um filho fugir às normas?

É sempre difícil aceitar que os filhos tem dificuldades e não caminham ao mesmo ritmo dos outros. No entanto, muitas destas crianças superam as suas dificuldades com terapia e são capazes de fazer a escolaridade de forma integrada, ainda que sejam feitas adaptações! É fundamental aliviar a culpa e a pressão que é sentida pelos pais, estando atentos às conquistas que a criança faz e não o que já deveria ter adquirido! A criança precisa de sentir que tem um tempo e um espaço próprio para aprender e que é apoiada pelos professores, pais e pessoas que gostam dela. Também quando a aprendizagem está ligada ao afeto é mais fácil aprender.

Que recado gostaria de deixar aos pais, sobre a forma de melhor lidarem com estas dificuldades?

É importante que os pais proporcionem momentos regulares de leitura, explorem histórias e incentivem a criança a ser ela a leitora. Nestas leituras, aproveite para valorizá-la, aumentando assim a sua confiança enquanto leitora. Mesmo que ainda não consiga ler, encoraje-a a manipular e comentar os livros que escolhe e demonstre prazer quando o partilha consigo. Esta partilha pode ser oral, mas também através do desenho, pintura, música ou dramatização.

Igualmente quando os pais das crianças são leitores e escritores envolvidos, que escrevem ou leem textos que elas escolhem e gostam de ouvir, e, ainda, quando as  experiências de literacia são positivas, entusiasmantes e encorajadoras, a criança sente-se mais motivada a aprender.

E, mesmo que a criança tenha consciência de que ainda não sabe ler ou escrever, deverá ser reconhecida nas suas várias tentativas e compreender os avanços que vai fazendo, acreditando e desenvolvendo sentimentos de competência enquanto futura leitora ou escritora.

O livro desafia os pais e educadores a gastarem tempo com as crianças, a fazerem exercícios ao mesmo tempo divertidos e pedagógicos, que as ajudam a ultrapassar dificuldades de aprendizagem. Nos dias que correm. em que até as tecnologias já roubam tempo ao tempo de qualidade em família, esta é uma expectativa realista?

Cada família é única e tem a sua forma aprender em família. Para além dos jogos ou exercícios divertidos, também é útil proporcionar uma variedade de materiais escritos, como jornais, revistas, livros sobre artes ou história, poesia, livros de canções e outros materiais electrónicos (internet, telemóvel ou computador), captando outros interesses da criança.

Podemos através das tecnologias aprender, desde que, seja em conjunto! E quando os pais se divertem com as crianças, com estes jogos, exercícios ou outros, estabelecem relações mais seguradas, prazerosas e a criança sente-se mais motivada para aprender.

Acima de tudo, é benéfico encontrar o momento, no dia a dia, onde a criança e os pais se envolvem na aprendizagem da leitura e escrita.

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Escrever Direito por Linhas Tortas

 

 

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