Anabela de Almeida - Amor em tempos de pandemia

Covid-19: O abraço, Anabela de Almeida 

Na sequência de um post no #BlogJulia sobre a dificuldade do distanciamento na família, a Anabela fez um comentário de dor. E de amor. Hoje descreve-nos melhor o momento. Pertence ao passado, esperamos. Mas Anabela continua sem conter as lágrimas quando o recorda.

“Sou avó de uma menina de 12 anos e de um menino com 7. Talvez pelo facto de ter havido uma altura em que tinha disponibilidade para ir buscar a minha neta à escola, acabei por criar com ela uma relação muito especial. Íamos ao jardim, lanchávamos as duas, conversámos sem olhar para o relógio. Os tempos mudaram e a vida no restaurante, da qual sou proprietária com o meu marido, nem sempre é fácil. Ainda assim, no ano passado, conseguíamos ir buscar os meus netos à escola, duas vezes por semana. Tomavam banho e jantavam na casa dos avós, e o pai, de caminho do trabalho para casa, levava-os de volta à noite. Com a pandemia, tudo ficou diferente. No restaurante, o Retiro do Caçador, em Moscavide, estou agora sozinha com o meu marido. Temos uma casa para pagar. Nunca fechámos. Funcionámos em take-away e, agora, com a metade da capacidade do restaurante, mantendo as orientações da DGS. Durante o período de confinamento deixámos de ver os meus netos. Passámos a usar as novas tecnologias. Mas não é a mesma coisa. A minha neta fez anos no dia 12 abril. Nesse dia, nem era permitido sair fora do concelho. O tempo foi passando, com dois meses a parecerem dois anos. Há dias, ainda no final do confinamento, liguei à minha filha e disse-lhe que não aguentava mais. Tinha que os ver ao vivo, à distância, da parte de fora do prédio. Fomos de carro até ao Montijo. E assim ficámos: eu e o meu marido, cá de fora, na rua, junto ao carro, nervosos, amparados pela saudade. A minha filha e os meus netos do outro lado do vidro da escada, a minha neta de sorriso triste. Todos em modo de silêncio. Mas quando a minha neta me estende os braços, expressando por gestos abraçar-me, os nossos rostos inundaram-se de lágrimas. E nesse preciso momento a minha filha tomou a decisão e carregou no interruptor. A porta abriu e ali ficámos abraçados, a chorar, todos, juntos, em família. É, para mim, um dos momentos marcantes desta pandemia”.

Photo by Jennifer Burk on Unsplash

Comentários

comentários