É preciso coragem

O que têm em comum os heróis?

Coragem. Significa que não ter medo? Errado. Já se nasce corajoso? Falso. Moral de história: estamos todos a precisar de umas lições sobre coragem.

 Em 2010, o Museu Imperial da Guerra, em Londres, recebeu uma exposição com o nome de Heróis Extraordinários. O psicólogo Patrick Tissington fez parte da organização e contou na altura que um dos seus objetivos com esta iniciativa era “enriquecer o conhecimento das pessoas sobre a guerra, explicando-lhes a psicologia da coragem”. Dizia o especialista que “a coragem é a gestão do medo” e que “não existe nenhum tipo de personalidade que esteja associado à coragem. Não é possível prever quem será ou não corajoso”. Patrick revela que, na verdade, o que existe são vários tipos de coragem. Um deles, aquele a que chama de “hot courage“, foi retratado no Museu Imperial da Guerra, em Londres, através de exemplos como o de Matthew Croucher, o soldado da Marinha Britânica que recebeu uma medalha pelo seu ato de coragem em 2008, no Afeganistão. Matthew estava de visita a uma fábrica de armas talibã quando se apercebeu de uma granada prestes a explodir. A sua rápida e instintiva decisão foi atirar-se para cima da granada, o que viria a salvar os companheiros. Graças à sua mochila, patente na exposição de Londres, também ele sobreviveu, apesar das escoriações. “Hot courage“, uma espécie de coragem a quente, refere-se à entrada em ação sem pensar nas consequências, mas apenas agindo de acordo com o que julgamos ser mais acertado no momento.

 

Sem medos?    

Muito pelo contrário, respondem os especialistas na área. “A coragem é uma resposta ao perigo, ao medo. O medo é crucial na coragem, é necessário haver medo para também haver coragem”, escrevem os autores de A Psicologia da Coragem. Aliás, terá sido o medo um dos motivos que levaram Julia Yang, Alan Milliren e Mark Blagen a desenvolverem um livro com mais de 200 páginas sobre o “músculo psicológico” (coragem). Os autores entendem que é necessário falar de coragem num século marcado pela apatia do “isto não é nada comigo” e perante uma sociedade absorvida em medos (medo de falhar, medo de perder o emprego, medo de assumir decisões), incapaz de intervir no mundo à volta. Coragem é, porém, um termo antigo: “Nunca poderá fazer nada neste mundo sem coragem”, dizia Aristóteles, filósofo que acreditava na coragem como uma das mais importantes qualidades humanas. Mas, afinal, o que é isto de ter coragem?

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Coragem há muitas!

 

Catarina Rivero é coach e psicóloga e apresenta-nos melhor a “coragem”: “A coragem será então uma virtude que integra as seguintes forças de caráter: bravura, persistência, integridade e vitalidade.” Embora possamos associá-la numa fase mais imediata a contextos épicos ou cenários de guerra, a coragem não é apenas física. Empresários, como Steve Jobs, que assumiram riscos ao decidir seguir os seus sonhos revelam-nos uma coragem intelectual. E no dia a dia sucedem-se os exemplos: “O blogger Brett McKay propõe os seguintes tipos de coragem: física (como nos casos dos bombeiros ou de polícias), intelectual (pessoas que ousam pensar e partilhar ideias diferentes das estabelecidas), moral (agir de acordo com os próprios valores, mesmo quando tal é desvalorizado por uma maioria), e a coragem para ser ‘grande’ (enfrentar os medos e/ou as fraquezas como a procrastinação, irritação, etc.)”, refere Catarina Rivero. A pergunta que se segue é: como trabalhar e/ou aumentar a minha coragem?

   

 

“Desenvolvemos a coragem ao praticar atos corajosos.” Aristóteles

 

Os neurocientistas descobriram recentemente uma área no cérebro (sgACC) que pode estar por detrás dos atos corajosos e ajudar a explicar como funciona a coragem. Poderá ser útil para tratar desordens de ansiedade, por exemplo, e consequentemente trabalhar a coragem. Na prática clínica, a psicoterapia dá uma ajuda, conforme explica a psicoterapeuta Catarina Rivero: aí, é possível identificar medos e bloqueios emocionais, bem como planear estratégias para os definir. Todavia, a própria psicoterapia é em si mesma um ato de coragem: entrar nesse percurso de se (re)encontrar e lidar com os próprios medos e abraçar as suas metas pessoais e sociais. E na prática, para o dia a dia, já no seu tempo Aristóteles tinha a resposta: treinar a coragem é a melhor forma de ser corajoso.

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