Mas afinal de contas o que é que venceu? Neste debate sobre a eutanásia, reparo que se fala muitas vezes de uma divisão entre a “morte” e a “vida”. Quando o que está em causa é a escolha. O direito de escolha. Eu quero ter o direito de escolher. Ainda que não o faça quando chegar a hora, eu quero saber que a opção me pertence. Não pertence a mais ninguém. Não pertence ao Estado. É o meu direito de escolha.
É por isso que sou absolutamente a favor da eutanásia. Respeito a votação do Parlamento. Respeito os elementos que por nós foram eleitos para votar. Respeito a liberdade de voto. Mas tenho a forte de esperança de podermos voltar ao debate com este tema em cima da mesa.
Mas há mais. Além do direito de escolha, o tema da eutanásia também expõe as fragilidades e desigualdades sociais/económicas. Há uns tempos, contei aqui a história de David, um cientista de 104 anos que dizia: “Na minha idade, queremos ser livres de decidir morrer”. Na Austrália, o seu país, a morte assistida não era permitida. David fez então 14 mil quilómetros para poder “morrer com dignidade” na Suiça, onde a eutanásia é legal. David fê-lo porque tinha possibilidades económicas.
Retomo a minha posição: quando chegar a minha altura, ainda que não tome qualquer iniciativa neste sentido, quero ter o direito à escolha.
O chumbo
A Assembleia da República chumbou esta terça-feira, na generalidade, os projectos de lei do PS, do PAN, do PEV e do BE que propõem a despenalização da eutanásia.
O CDS, o PCP e a restante bancada do PSD votou contra. Eram necessários, pelo menos, 115 votos favoráveis para um dos projetos passar.
O debate demorou quase três horas sobre quatro projectos de lei – do PS, BE, PEV e PAN – que legalizam a eutanásia, à semelhança do que acontece em outros países.
Como a Bélgica, onde um jovem de 17 anos tornou-se o primeiro menor a morrer através da eutanásia, em 2014.
Em Espanha, país do filme premiado “Mar Adentro” – que conta a história real de um homem, o tetraplégico espanhol Ramón Sampedro, que luta pelo direito à morte – foi aprovada uma reforma do Código Penal que reduziu as condenações em caso de eutanásia e de assistência ao suicídio.
“Sou uma cabeça sem corpo”, afirmava Ramón Sampedro, o espanhol de Mar Adentro que concretizou o suicídio assistido, oito anos após ter declarado o seu desejo de morrer.