O Mundo de Pinóquio: O que acontece quando não se consegue parar de mentir?

Dia da Mentira: No Mundo de Pinóquio

Quem nunca pregou uma mentira que atire a primeira pedra. Mais difícil será reconhecer quando se passa a vida a mentir.

O problema tem nome − mitomania − e pode ter explicação, segundo o psiquiatra Cláudio Moraes Sarmento. Mas a solução… isso já é mais complicado.

Os estudos mostram que todos temos uma costela de Pinóquio. Mentimos entre dez e duzentas vezes por dia, dependendo do perfil de cada um e, sobretudo, da quantidade de relações sociais e interações que temos. E fazemo-lo pelas mais variadas razões.

O psiquiatra Cláudio Moraes Sarmento explica que “existe um grande leque de possibilidades de mentira e pode haver muitas motivações para mentir. Por exemplo, imaginar uma realidade desejada (ambiente familiar melhor), mentir para suposta aceitação e admiração dos outros (por baixa autoestima), por medo de represálias, culpa, entre outras”.

Branca, por pureza de intenção?

Devido à sua frequência, há uma certa tendência para banalizar ou até catalogar a mentira como positiva – a chamada ‘mentira branca’.

“Desde criança que se pode mentir, para escapar a um castigo, até à ‘mentira branca’ no adulto, que poderá ser adaptativa à sociedade. Existe um grande leque de possibilidades de mentira”, reconhece o psiquiatra.

Mas há mentirosos e mentirosos.

Há pessoas que insistem na mentira e que a levam para outro nível, fazendo dela uma forma de estar na vida. Falamos dos mitómanos, também conhecidos como mentirosos compulsivos. São aqueles que não conseguem relatar um momento ou ter uma conversa sem “acrescentar um ponto” à história. Acabam muitas vezes por perder a noção da realidade.

A necessidade de enganar o próximo

Nem sempre é fácil definir a fronteira entre uma mentira… e a mitomania. Esta é uma condição identificada, pela primeira vez, em 1905, pelo psiquiatra francês Ernest Dupré.

Não tem nenhum quadro clínico específico na lista de doenças mentais. A mentira compulsiva surge, segundo o psiquiatra Cláudio Moraes Sarmento, como “uma perturbação psicológica em que a pessoa tem uma obsessão pela mentira e não um diagnóstico psiquiátrico. Como tal, não pode ser classificada como doença”.

Apesar disso, a mentira pode tornar-se um vício, já que é dita de forma compulsiva. Os mentirosos patológicos “sabem que estão a mentir mas não conseguem controlar o impulso de mentir, num processo que surge de uma forma muito semelhante ao de outras dependências”.

Como o álcool e a droga, explica.

São várias razões que podem levar uma pessoa a transformar a mentira numa forma de estar na vida. A principal consiste sempre em valorizar o mentiroso. Por exemplo, “as pessoas podem mentir para obter um ganho secundário ou para criar uma realidade desejada”, refere o especialista. Mas hoje sabe-se que as principais causas da mentira patológica “estão associadas a perturbações de personalidade, baixa autoestima, a um trauma (na infância), a um ganho secundário imediato, culpa, entre outras”.

 

Os efeitos da mentira compulsiva

As repercussões negativas que a mentira pode ter a nível familiar e social são inquestionáveis. Pode ir desde o simples embaraço e queda no ridículo a problemas mais graves. Chega a dificuldades nos relacionamentos sociais, elevados níveis de sofrimento e distúrbios de personalidade.

“A exclusão é frequente nestas situações, bem como o subsequente isolamento e eventual quadro depressivo secundário”, alerta Cláudio Moraes Sarmento.

Nos mentirosos patológicos, independentemente das causas, a mentira é quase sempre muito bem fundamentada. Tão estruturada que se torna difícil desmontá-la ou mesmo duvidar da sua veracidade. E, como não conseguem evitar mentir, fazem tudo para evitar que a mentira seja descoberta. Criam situações e outras histórias para as sustentar, passando a viver num estado permanente de stress.

Além disso, a intensidade com que acreditam na mentira é tão elevada, que os mentirosos a veem como parte de si e como um meio para atingir os seus objetivos. O hábito criado, além de forte e poderoso, cria uma sensação enganosa de controlo, o que leva a que sintam vontade/necessidade de repetir o mesmo padrão de pensamento e comportamental.

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