Baleia Azul: "Não é moda", diz psicóloga clínica

Baleia Azul: “Não é uma moda” – Psicóloga Clínica

O jogo da Baleia Azul é nada menos do que assombroso. Vindo da Rússia, passando pelo Brasil, já fez as primeiras vítimas em Portugal. Incide maioritariamente em jovens. Falei com a Psicóloga Clínica, Dra. Inês Afonso Marques, da Oficina de Psicologia, para me explicar sobre estes acontecimentos.

 

Como encara o sucesso do jogo da Baleia Azul?

Não sei se associo a palavra sucesso a este jogo. De todo o modo, a visibilidade que lhe está a ser dada é um alerta para pais e educadores para uma realidade existente entre a população juvenil. O tema da auto-mutilação e da (dificuldade de) gestão emocional entre os jovens, os comportamentos auto-lesivos, são uma realidade que existe para além deste jogo.

Quem assume este tipo de comportamentos e quem entra num “jogo” deste género é alguém que está em sofrimento. Ou quem tenha algum grau de vulnerabilidade emocional. Acresce a vulnerabilidade típica de um cérebro adolescente, fase em que existe ainda uma enorme dificuldade no planeamento e no controlo dos impulsos. Fazer escolhas conscientes, analisar situações a médio/longo prazo, travar impulsos são tarefas desafiantes para qualquer cérebro adolescente. E algo que é inerente às tarefas de desenvolvimento da adolescência. Mais quando o jovem inicia um processo crescente de autonomização, face às figuras de referência. Fase na qual os seus pares (outros jovens) assumem papel de destaque.

 

Enquanto psicóloga e profissional que acompanha crianças/jovens, quais são os principais conselhos a dar aos pais/encarregados e às crianças?

A exibição de comportamentos de risco e/ou comportamentos auto-lesivos são pedidos de ajuda. A dor física é utilizada, na maioria dos casos, com a intenção de aliviar uma dor emocional forte e insuportável. Por norma são jovens com uma baixa auto-estima, definindo-se de forma auto-crítica. Não é uma moda. A auto-mutilação é considerada uma tentativa de alívio de dor emocional, quando as tentativas de regulação das emoções falham.

Recomendo que pais e outros cuidadores estejam genuinamente atentos e disponíveis. Que nunca desvalorizem, critiquem ou ridicularizem a criança ou adolescente por aquilo que diz pensar ou estar a sentir.

É importante que estejam atentos a alterações de comportamento. Oscilações de humor, isolamento social, comportamentos estranhos, alterações no padrão do sono ou alimentar, desinteresse generalizado. Estejam atentos ao corpo dos filhos, a marcas no corpo como arranhões, queimaduras, nódoas negras. Questionem o uso de roupas pouco adequadas ao clima, por exemplo, mangas compridas em dias de muito calor.

É também fundamental que os pais incentivem o uso regrado, e de forma segura, das tecnologias e das redes sociais. Os pais não podem assumir que os filhos conhecem todos os perigos e regras básicas de segurança. Cabe aos pais fazer essa sensibilização. É muito importante lembrarem-se que também eles são referências nesse aspecto.

A comunicação eficaz dentro da família é verdadeiramente importante para que o adolescente se sinta valorizado e confiante. Assim como é importante criar rotinas. Para que todos se sintam livres e aceites na partilha de ideias, dúvidas, preocupações e conquistas. Terão um valor inestimável no desenvolvimento de uma auto-estima positiva e na prevenção de comportamentos de risco.

 

O que fazer quando se descobre que alguém próximo pode estar envolvido no jogo?

É muito importante não relativizar o assunto. Nem assumir que se trata de uma “patetice” de miúdos, que há-de passar. Por um lado, deve comunicar-se às autoridades. Afinal, existe alguém que está a ser vítima de um crime. Por outro lado, alguém que se envolve num jogo deste género é, à partida, alguém que está vulnerável, emocionalmente frágil. Necessita de apoio especializado. O encaminhamento para um técnico especializado, como um psicólogo, será relevante.

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