“Esta é a história de uma mãe que faz tudo pela filha mas que é uma mãe desesperada”

“Esta é a história de uma mãe que faz tudo pela filha mas que é uma mãe desesperada”

Regra geral, a doença de Alzheimer é uma forma de demência que atinge os nossos pais. Mas nesta edição, no Mês Internacional do Alzheimer, apresento-vos um caso diferente: uma mãe, uma lutadora, que cuida da filha que sofre de Alzheimer.

Alzheimer, aquela doença associada ao declínio da nossa capacidade mental por exaustão, por motivos genéticos, ou que nos assola quando nos distanciamos da nossa data de nascimento.

Quando me começa a falar, pede-me para me despachar, para me poder contar aquilo que eu preciso que conte, para dar este testemunho o mais rapidamente possível. Pergunto se devo deixar para outro dia, se prefere não contar a sua história de todo. “Não. É importante que as pessoas saibam. É muito importante.”

Conceição tem mais de 80 anos, mas aqui a sua voz assume uma determinação de muitas mulheres executivas no auge da sua carreira aos 40. A filha, com 60 anos, recebeu o diagnóstico há três anos. Conceição pede-me que não revele o seu nome.

“Queixava-se de que se esquecia de muita coisa”, começa por me contar.

“E vou ser sincera: na altura, nem o companheiro dela ligou muito, e dizia que o mal dela é que era preguiçosa. E nós todos nos esquecemos de algo, alguns mais do que outros.”

Tudo mudou quando Conceição recebeu uma chamada da empresa onde a filha trabalhava. Já não conseguia estar sozinha e trabalhar. O diagnóstico foi um choque muito grande. Foram as colegas da filha que levaram a que fossem tomassem medidas e marcadas consultas e exames. “Desde especialistas a psicólogos, fez-se até uma punção lombar que custou 4400 euros, sem compartipação, veja lá”, conta, com a voz a quebrar. Ainda é uma ferida aberta, com a revolta de não ter nenhum desconto.

“Foi muito triste. Esta é uma história de uma mãe que faz tudo pela filha mas que é uma mãe desesperada.”
Uma pausa, deixo-a recuperar o fôlego após um momento de maior emoção. Conceição continua por iniciativa própria. “A minha filha era uma pessoa cheia de genica”, diz-me, “mesmo depois de o pai ter falecido devido a um cancro no pâncreas. Era muito arrumada, mas hoje é pior que uma criança.”

Suspira. “Mas só se pode tratar deles com muito carinho, muito carinho e amor. Uma pessoa perde a paciência muito facilmente, porque uma criança aprende, mas a minha filha não.”

O dia a dia mudou bastante. Conceição dedica-se inteiramente à filha. Passeiam juntas, para mudar de ares, para sentir o local da sua origem, pois a memória do mesmo não dura. “Já não há troca de impressões, ela está a fazer a vida dela e nós só temos é de acompanhar.”

Com a voz embargada e exausta, Conceição confessa-me que não sabe se consegue aguentar: “É uma situação tão complicada. Tenho 80 anos…”

Pergunto-lhe sobre conselhos para outros pais que sejam surpreendidos por uma situação como esta. Conceição interrompe-me. De repente, surge-me outra pessoa: uma mulher com uma energia que eu até agora desconhecia. É a voz enérgica, feliz, forte, de quem recebe a filha, acabada de chegar a casa vinda do centro de apoio onde passa as tardes. É a força de alguém que não pára de amar, da maternidade bordada nos lábios. “Olha a minha filha! Olha a minha filha! Já chegaste? Que bom!” Não chega a dar-nos os conselhos que pedimos. Mas está nas entrelinhas… “A força vem dos sítios mais inesperados”, afirma.

E eis que os laivos de memórias parecem fazer com que a filha de Conceição esboce um sorriso e diga um carinhoso “Mãe!”. E, por entre a passividade de uma mente sem âncora, a força de uma mãe brota da adversidade.

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