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a inutilidade da perfeição

Crónica de Pedro Chagas Freitas

 

Dói-me o que já fui.

A idade chega e não avisa, e vem pelo corpo, claro, vem sempre pelo corpo.

Sou uma ex-mulher, é assim que me sinto.

Passaram os dias no meio da pele, no meio de mim.

Tenho uma lágrima que não pára no interior do peito.

Dói-me o que o corpo não me deixa ser: a partir de que momento deixamos de ser vida e passamos a ser fim? Como se suporta a sensação de que fiquei para trás?

Tenho de me adaptar ao insuportável.

Tenho de redefinir o que me define. Crescemos a ver a mulher como a que tudo suporta, a que tudo transporta. Os filhos, o trabalho, uma carreira, a casa. E agora apetece-me cair. Há constantemente uma desistência fácil para quem não tenta.

Sou, mais do que nunca, o que nunca fui.

Nunca me senti assim, mesmo que nem sequer saiba como me sinto. Sou um oposto de mim, um anti-mim. Ser mulher é saber continuar: preferir continuar.

Sou o que posso ser.

Somos sempre o que podemos ser.

Sobreviver é valorizar o que ainda podemos ser. E há tanto que se perde quando só olhamos para o que perdemos.

Acordo cansada, mas viva. Sempre viva. Sempre a caminho. O segredo da vida é estar sempre a caminho de qualquer coisa.

Só não perde aquele que, mesmo depois de perder (e mesmo depois de vencer), continua apaixonado pelo que ainda pode ganhar.

Por mais pouco ambicioso que seja, basta-me o suficiente para ser suficiente ‒ desde que o aproveite de uma forma extraordinária. Incrível, não é?

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